segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

o seio





o leve ondular
do teu magnífico
seio aveludado
suave
como que tocado
por um poeta
lentamente apaixonado
doente
(porque tu
que és bela
e perfeita
como
uma rosa acabada
de desabrochar)
envenenas de morte
quem te toca
o maravilhoso mamilo
espetado
numa viagem de morte
com um velho lobo do mar
que de antemão
sabe ir
naufragar
no teu corpo
torneado de pecado
como que bebido
em longos tragos
de rum
ó jovem seio
seio de menina
que as gotas limpídas do teu rum
me tragam
de novo


àvida

sábado, 13 de dezembro de 2008

conto de Natal






Boas Festas para todos, em especial para aqueles que, de quando em quando, passam por aqui...




Lembras-te de me olhar através da janela aberta do miserável quarto que partilhávamos, no segundo andar naquela pensão miserável, carregada de percevejos, pulgas e outros animais de maior porte, que cheiravam a merda e a sémen? Olhavas-me, de pescoço esticado, colocada sobre as folhas moribundas do Outono, que caíam lentamente das duas árvores que ficavam mesmo em frente à porta da pensão.
Através da tal janela aberta (apesar do frio imenso) vias-me debruçado, numa batalha com a máquina de escrever, a tentar ajudar-te a equilibrar o curto e incerto orçamento diário (uns dias comia-se, outros não, noutros havia água engarrafada - noutros não – por vezes tinhas dores de estômago arrepiantes, ficavas na cama, cheia de febre, dias seguidos e não havia dinheiro para ir buscar o remédio que te dava alívio.. Eu dizia-te aborrecido: “andas para aí a comer merdas que te fazem mal. Assim não entra dinheiro durante dias…” Ela respondia, a medo: vai trabalhar grande cabrão, chulo de merda!” eu enfiava-lhe um directo, que lhe punha ao olho negro durante uns dias (ela já sabia que isso lhe ia acontecer, mas não era capaz de ficar calada, era mais forte que ela.” . Eu fumava e bebia sem parar, quando havia guito, dava uns calduços de heroína. Ela rezava aos santos e santas da sua preferência, que tinha alinhados num pequeno armário, tipo altar, ‘rão a ver? Nunca consegui vender nada daquilo que escrevo: não sou escritor, não sou escriturário, não sou jornalista e, menos ainda, poeta – um dia, cheio de orgulho desci à taberna com uns versos para serm cantados em fado, entreguei-os ao bêbedo de serviço, que era suposto cantá-los. Antes de o fazer, leu-os em voz alta à selecta audiência composta por putas, chulos, gajos à procura de gajas, e até um ou outro paneleiro. Tudo gente conhecida, foi a risota geral, estridente, também. É claro que eu não me fiquei e houve tareia da grossa. Chamaram a polícia, a coisa ficou por ali, com meia dúzia de nódoas negras, bebemos um copo, eu dorido e ferido no meu orgulho, fui para a minha janela. Nunca mais, nem por brincadeira, quis ouvir falar em poesia: sou um prosador! Sobretudo, não sou nenhum artista falhado! Sou um falhado em tudo. Não gosto nada de falar de mim próprio, mas hoje, à falta de melhor é sobre mim que estou a escrever. Estive preso – matei um tipo (numa bela dança de navalhas) que me andava a foder o juízo, por causa de uma puta muita feia, que era minha “empregada”, apanhei uma montanha de anos de cadeia. Por bom comportamento, (julgavam eles…), mandaram-me embora para aí a meio da pena. Estou cá fora há dois anos e continuo a portar-me muito mal. Quando não há comida roubo; quando as coisas vão mal com a Tina, a puta que vive comigo e me sustenta, dou-lhe uma carga de porrada, que a impede de trabalhar durante umas duas semanas – passadas a gemer, durante essa eternidade insuportável em que ela está em casa, na cama, por vezes ainda a carrego com mais uma ou duas tareias. Ela grita tanto, que se ouve a dois quarteirões de distância. Clama sobretudo por Nossa Senhora de Fátima. A janela está sempre aberta, por respeito para com a Tina, que não fuma tabaco. Apenas uns charros para aliviar a dor. Eu estou quase sempre ali, ao frio com toda a roupa quente que possuo: uma camisa de flanela e um pullover fininho, que gamei a um tipo, na taberna; junto à janela tenho a máquina de escrever, uns papeis – que recorto dos jornais, nem sei muito bem para quê… tenho também uma resma de papel A4, que surripiei na loja do chinês, aqui mesmo ao lado!)
Como já disse decidi escrever a minha autobiografia, que contém, tenho a certeza, conhecimentos e vivências úteis à humanidade ignorante e sequiosa de cultura. A Tina estava sempre de acordo com as coisas que eu dizia. Que remédio tinha ela: era a única pessoa com quem podia falar e fazer estes discursos eruditos. Quer tivesse ou não paciência para me aturar, doente, ou depois de aviar cinco ou seis gajos numa noite – desde sadomasoquistas passando por pedófilos frustrados e até paneleiros que não tinham encontrado um traseiro para descarregar. Ela chegava toda rota a casa. Não tinha nada para comer, eu aquecia água no minúsculo fogão, pra ela fazer o seu chá. Um dia, estava eu no meu local de trabalho, deviam ser para aí umas cinco da matina, ouvi uma peixeirada do caraças. Aproximei-me da borda da janela e mandei um berro: “pouco barulho, grandes cabrões.” Do outro lado responderam-me em linguagem ainda mais refinada, o que me deixou danado. Passados vários minutos ouviu-se um estrondo na porta do quarto. Fui a correr abrir. Era a Tina, agarrada ao ventre, que tinha cortes profundos feitos por uma faca bem afiada, destinada a matar. A rapariga estava coberta de sangue dos pés à cabeça, sem força sequer para pedir ajuda aos seus anjos e santos, num misto de dor e de incredulidade. Morreu-me nos braços passados uns minutos. As suas últimas palavras foram “ai! Minha mãe”. Depois chegou a polícia com o chavascal do costume e eu fui sentar-me na minha cadeira junto da janela e lembrei-me da Tina nessa tarde de um dia de Dezembro a arranjar o presépio, a montar uma pequena árvore de Natal, com pequenas luzes a piscar e a enfeitar os santos, anjos e outras entidades protectoras. “Para quê? Disse eu entre dentes, para não levar umas palmadas dos pasmas. Chorei umas lágrimas sobre a inútil mesa e acrescentei “bom Natal…” Depois de a polícia sair fui ao altar da Tina e abri o pressente que me tinha reservado para esse dia tão especial para ela: um anjo pequeno em barro, para me propeger, queeu guardei junto dos dela. A tina não era aquilo que se chama um sex symbol, longe disso, mas eu gostava dela.